Segundo o achado, Vênus pode ter permanecido seco durante quase toda a sua história, contradizendo a ideia de que o planeta teve oceanos líquidos. De acordo com cientistas, isso abre espaço para a possibilidade de formas de vida extremas em suas nuvens. Impressão artística das nuvens de Vênus, o segundo planeta do Sistema Solar.
ESA
Cientistas anunciaram nesta segunda-feira (2) uma descoberta intrigante sobre Vênus: seu interior pode ter sido seco durante quase toda a sua história.
Isso desafia a compreensão atual de que o segundo planeta do Sistema Solar já teve oceanos líquidos em sua superfície, aponta um novo estudo publicado na revista científica "Nature Astronomy".
A pesquisa sugere que, diferentemente da Terra, Vênus nunca teve condições adequadas para formar e sustentar oceanos. Isto é, o planeta pode ter sido inóspito desde o início.
E, embora essa descoberta descarte a possibilidade de formas de vida semelhantes às da Terra no planeta, ela abre espaço para uma outra possibilidade: a chance de existirem formas de vida extremas e fora do comum nas nuvens hostis do planeta.
"Uma teoria sugere que, caso haja vida nessas nuvens atualmente, ela pode ter migrado de uma superfície que, em algum momento, foi habitável", diz ao g1 Tereza Constantinou, uma das autoras do estudo e doutoranda no Instituto de Astronomia da Universidade de Cambridge.
Neste cenário, os cientistas imaginam que, à medida que Vênus foi aquecendo por causa de um efeito estufa fora de controle, seus oceanos começaram a ferver como uma chaleira no fogão. E isso fez com que a superfície do planeta se tornasse cada vez mais quente e inabitável.
Com esse ambiente cada vez mais hostil, a vida (caso tenha existido) poderia ter migrado para um lugar mais favorável às suas condições de sobrevivência: um "refúgio" nas nuvens que retém o calor e fazem de Vênus o planeta mais quente do nosso Sistema Solar.
"No entanto, a ausência de oceanos no passado de Vênus indica que o planeta nunca teve as condições necessárias para desenvolver e sustentar formas de vida semelhantes às da Terra. Ou seja, Vênus jamais foi habitável", acrescenta Constantinou.
Parece controverso, mas a especialista explica que o fato de Vênus não poder abrigar formas de vida como as da Terra não exclui a possibilidade de que, no futuro, possamos encontrar algo totalmente diferente por lá.
Isso quer dizer que, embora Vênus não tenha as condições atuais de sustentar organismos que dependam de água e de uma atmosfera mais tranquila, ainda há uma chance de que algo mais extremo e incomum possa existir.
Embora isso descarte a possibilidade de vida terrestre em Vênus ou em exoplanetas com características similares, mantém aberta a chance de formas de vida extremas e pouco convencionais existirem no ambiente hostil das nuvens venusianas. Qualquer vida potencial nessas nuvens teria que se originar e evoluir sob condições completamente diferentes.
Assinatura geológica
No seu estudo, Constantinou e outros cientistas analisaram a atmosfera atual de Vênus. Isso é algo importante porque a composição dos gases vulcânicos lançados ao ar reflete o teor de água no interior do rochoso planeta.
E foi usando modelos químicos que eles descobriram que o interior de Vênus contém pouquíssimo ou nenhumo hidrogênio, elemento fundamental para a presença de água.
Com isso, eles puderam então constatar que Vênus não só é seco hoje como, provavelmente, sempre foi assim. Qualquer água que possa ter existido no planeta teria permanecido na forma de vapor na atmosfera, sem nunca condensar para formar líquidos na superfície, e eventualmente escapou para o espaço.
Vista em perspectiva tridimensional gerada por computador mostra a superfície de Vênus.
Nasa/JPL-Caltech
Dessa forma, a conclusão dos pesquisadores é clara e desafia o entendimento atual sobre o planeta: o interior extremamente seco de Vênus aponta para um passado igualmente seco.
"Se Vênus tivesse tido oceanos na superfície esperaríamos um sistema rico em água, o que exigiria uma solidificação rápida do oceano de magma, minimizando a perda de hidrogênio para o espaço após a condensação da água", aponta Constantinou.
Ou seja, se o planeta tivesse tido oceanos em algum momento, seu interior teria retido parte dessa água, assim como acontece na Terra. Mas seu interior seco funciona como uma assinatura geológica de que Vênus nunca teve água líquida.
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Os cientistas apontam implicações importantes para o estudo de exoplanetas sobre esse achado. Isto porque, entender a história de Vênus ajuda também a interpretar a habitabilidade de planetas em zonas habitáveis ao redor de outras estrelas.
Planetas similares a Vênus, localizados perto da borda interna das chamadas zonas habitáveis (onde um planeta poderia potencialmente sustentar vida), são provavelmente secos e incapazes de sustentar vida.
Por isso, Constantinou defende que a busca por mundos habitáveis, que vem sendo intensificada com o auxílio de supertelescópios como o James Webb, deve se concentrar em corpos celestes mais semelhantes à Terra.
Isso porque esses planetas têm muito mais chances de reter água líquida, uma condição fundamental para o surgimento e a manutenção de formas de vida como as conhecemos.
E o Webb, por exemplo, é altamente eficaz em estudar atmosferas de planetas próximos às suas estrelas hospedeiras, especialmente aqueles localizados na borda interna da zona habitável.
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