O mais recente boletim do observatório reúne os dados coletados entre julho e setembro deste ano, período em que Minas lidera a lista ao lado de São Paulo, ambos com 13 registros. Até o primeiro semestre de 2023, Minas Gerais ocupava o quarto lugar na relação de estados com mais ocorrências de violência política desde 2020, com 120 casos. Nas três primeiras posições estavam Bahia, com 134 episódios; o Rio de Janeiro, com 142; e São Paulo, com 210.
A ascensão de Minas Gerais ao topo infame da lista no terceiro trimestre está relacionada aos recentes episódios de ameaças de estupro e morte de vereadoras e deputadas. Esse contexto também dialoga com um aumento da parcela feminina entre as vítimas de violência política. Até o primeiro semestre deste ano, na série que se inicia em 2020, haviam sido registrados 1.637 casos, sendo 1.371 contra homens (83,8%) e 266 contra mulheres (16,2%).
No boletim do terceiro trimestre de 2023, 62 casos de violência política foram registrados contra homens, 70,5% do total. As mulheres foram alvo de 29,5% das ocorrências, o que significa um aumento de 16,9 pontos percentuais em relação ao recorte divulgado no trimestre anterior. À reportagem, o pesquisador do Observatório de Violência Política e Eleitoral da Unirio, Miguel Carnevale, aponta que o aumento desse percentual pode estar relacionado a uma atenção maior à violência de gênero dentro do cenário político. No entanto, ele destaca que o que vem à luz tende a ser uma pequena parcela do que acontece na realidade.
“Acho que esse aumento passa por muitos fatores. A implementação da lei contra violência política de gênero pode estar relacionada com o angariamento de uma maior atenção a esses episódios de violência. Com a implementação dessa pauta no centro do debate público é possível se entender um pouco do aumento na notificação dos casos contra mulheres. Mas tudo leva a crer que ainda há uma subrepresentação. Os episódios recentes de ameaças por e-mail, inclusive para uma série de vereadoras e deputadas mineiras, devem ser apenas a ponta do iceberg dos casos dessa natureza”, disse o pesquisador.
Nos últimos meses, parlamentares mineiras estamparam as páginas do noticiário nacional ao denunciar uma série de ameaças recebidas, em sua maioria, via e-mail. Com diferentes remetentes, as mensagens enviadas têm em comum o caráter misógino e machista, utilizando termos como ‘estupro corretivo’, além de ofensas homofóbicas e descrições detalhadas de agressões. No período, relataram ter sofrido as violências as deputadas estaduais Lohanna França (PV), Beatriz Cerqueira (PT) e Bella Gonçalves (PSOL); as vereadoras de Belo Horizonte Cida Falabella (PSOL) e Iza Lourença (PSOL); e as vereadoras de Uberlândia, Cláudia Guerra (PDT) e Amanda Gondim (PDT). (Leia mais sobre ameaças a parlamentares na página 5)
Outro ponto em comum nos casos das parlamentares mineiras ameaçadas é o fato de todas integrarem partidos de centro-esquerda ou de esquerda e estarem aliadas a pautas progressistas. “Há sim um certo padrão na distribuição de gênero por ideologias. De modo bem resumido, há uma associação entre vítimas femininas e a esquerda, e vítimas masculinas e a direita”, explica Carnevale.
Recorte feito pelo pesquisador mostra que, em 2023, 55,9% das mulheres vítimas de violência política eram de esquerda. O percentual sobe para 62% se analisado apenas o terceiro trimestre. No caso dos homens, a situação é oposta, 62% das vítimas no ano são de direita e o número chega a 80% se analisado apenas o intervalo entre julho e setembro.
Ainda assim, num cenário geral, a distribuição partidária em casos de violência é equilibrada em relação a espectros políticos. No boletim deste trimestre, as legendas mais recorrentes são o PT, que lidera com 11 casos; seguido pelo PSDB, com 10; e Podemos e PP têm 7 casos cada.
Tipos de violência
O boletim do terceiro trimestre do observatório aponta que o tipo de violência política mais registrado são as ameaças, que representam 46,6% dos casos. O número foi inflado por 11 episódios em Minas Gerais. O segundo tipo mais frequente são as agressões, com 25% do total; seguido por homicídios, com 13,6%; e atentados, homicídios de familiares e sequestros, com 4,5% cada. O Giel realiza o levantamento com o acompanhamento de veículos de comunicação a partir de alerta do Google, que envia diariamente relatórios a partir de um conjunto específico de palavras-chave. A metodologia define violência política como “qualquer tipo de agressão que tenha o objetivo de interferir na ação direta das lideranças políticas, como limitar a atuação política e parlamentar, silenciar vozes, impor interesses, eliminar oponentes da disputa, restringir atividades de campanha, dissuadir oponentes de participar do processo eleitoral e/ou impedir eleitos a tomar posse”.
Estadão