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A vida clandestina do hacker Walter Delgatti

Poderia ser um roteiro de ficção: um hacker, cuja atuação ajudou a libertar da prisão um ex-presidente e pode levar outro para a cadeia.

Por Jr Blitz 20/08/2023 às 05:06:48
Poderia ser um roteiro de ficção: um hacker, cuja atuação ajudou a libertar da prisão um ex-presidente e pode levar outro para a cadeia. Mas é a mais pura realidade e o personagem atende pelo nome de Walter Delgatti Neto, de 34 anos, conhecido como o “hacker de Araraquara”, município de médio porte do interior paulista, conhecida internacionalmente por uma conferência feita em 1960 pelo filósofo francês Jean Paul Sartre, que esteve acompanhado pela mulher, a também filósofa Simone de Beauvoir. Conhecido na cidade, sua terra natal, pelo apelido de Vermelho, não por questão ideológica, mas em função da cor dos cabelos e da barba, tonalidade hoje praticamente imperceptível, já que eles foram cortados no presídio onde Delgatti está desde 2 de agosto, quando foi preso pela segunda vez pela Polícia Federal.
Mas quem é essa figura incendiária, o “hacker da Lava-Jato” ou o “homem bomba” do governo Bolsonaro, como Delgatti é chamados nas redes sociais? Pouco se sabe sobre a vida privada de Delgatti, mas sua folha corrida revela que o programador sempre teve vida atribulada, com passagem pela polícia por apreensão de psicotrópicos, falsificação de documentos e acusação de estelionato e outra, em 2015, de estupro, posteriormente retirada pela vítima.
Delgatti herdou o nome do avô paterno, Valter Delgatti, casado com Otília Gomes Delgatti, de 86 anos. Viúva, foi ela a responsável pela sua criação e do seu irmão, Wisllen Francisco Delgatti, quatro anos mais jovem que o hacker, desde quando a mãe, deles, Silvana Aparecida Francisco Delgatti, separou-se do pai, Valter Delgatti Júnior, falecido.

ENTORPECENTES


Já morando sozinho, ainda em Araraquara, começaram, em 2013, os problemas do hacker com a Justiça. Ele foi condenado em segunda instância por causar prejuízos de cerca de R$ 600 mil a uma instituição financeira, acusado de desbloquear cartões bancários desviados, mas o crime prescreveu. Na outra, de 2015, foi condenado por adquirir produtos com um cartão de crédito furtado. Nesse mesmo ano, foi também acusado de estupro pela então namorada do irmão, que posteriormente mudou o depoimento e desmentiu sua própria denúncia.
Mas durante uma operação de busca e apreensão no apartamento de Delgatti, em função das suspeitas que recaíam sobre ele por esses problemas com a Justiça, a polícia apreendeu em sua residência 247 comprimidos de psicotrópicos, resmas de papel azul, guilhotina, receitas em nome de terceiros e uma carteira falsa de estudante de medicina.
Por causa dessa apreensão, o promotor do Ministério Público de Araraquara, Marcel Zanin Bombardi, o indiciou por tráfico de drogas e falsificação de documentos. As acusações de estelionato ainda são alvo de recursos. Na de tráfico, ele foi inocentado, em 2018, mas foi condenado a dois anos de regime semi-aberto, com direito a recorrer da sentença em liberdade, por falsificação de documentos públicos.

CONTATOS DA LAVA-JATO

Tentando achar algo contra o promotor que o denunciou, Delgatti contou em depoimento à Polícia Federal, que invadiu o celular de Zanin, o que o levou aos contatos de outros integrantes do Ministério Público, dando origem ao hackeamento das conversas dos integrantes da Lava-Jato, posteriormente vazadas por Delgatti e publicadas, em junho de 2019, pelo portal de notícias The Intercept. Essas conversas contribuíram para a soltura de Lula pelo Supremo Tribunal Federal (STF) – que anulou as sentenças da Lava-Jato por considerar a Justiça Federal de Curitiba incompetente para julgar os processos do petista – e a prisão de Delgatti, posto em liberdade em setembro do ano seguinte para responder pelo grampo contra autoridades.
“Se eu tivesse foco na Lava Jato, teria conseguido antes. A Lava-Jato é o último lugar em que imaginei que encontraria irregularidades”, disse Delgatti em entrevista após invadir as mensagens dos integrantes da operação. Nesse meio tempo, o hacker, já famoso nacionalmente pelo grampo, se envolveu com a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), que intermediou um encontro de Jair Bolsonaro com ele. Eles são suspeitos de uma suposta invasão ao sistema do Conselho Nacional de Justiça para incluir documentos falsos, entre eles um mandado de prisão contra o ministro do STF Alexandre de Moraes e também de tentativas de fraudar as urnas eletrônicas com um falso código-fonte.
O programador, que invadiu os celulares de integrantes da Lava-Jato, dando início a investigações que apontaram a parcialidade da operação e garantiram a soltura de Luiz Inácio Lula da Silva, hoje novamente presidente da República, prestou o depoimento mais polêmico da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos atos golpistas até agora. Ele fez graves acusações ao ex-presidente Jair Bolsonaro, que podem contribuir para que o ex-mandatário da República seja preso. Segundo o hacker, Bolsonaro queria que ele forjasse a invasão de uma urna eletrônica com um código-fonte falso para desacreditar o pleito e assumisse também a autoria de um suposto grampo no celular do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. Ele disse também no depoimento que Bolsonaro prometeu conceder indulto caso fosse preso. A deputada e Bolsonaro negam todas as acusações feitas por Delgatti em depoimento à Polícia Federal e à CPMI. O ex-presidente disse que vai processar Delgatti por calúnia e difamação.

FILHO 

A vida mirabolante de Walter Delgatti Neto tem ainda muitos outros capítulos. Depois de ficar nacionalmente conhecido pelo suposto grampo no celular do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, uma jovem com quem Delgatti se relacionou o reconheceu em uma reportagem e entrou com pedido de DNA para comprovar a paternidade de uma menina, hoje com cerca de 4 anos, que ela dizia ser filha do hacker, fato comprovado pelo exame. A reportagem tentou contato com o advogado de Delgatti, Ariovaldo Moreira, e com seu irmão, mas nenhum deles respondeu aos pedidos de entrevista.







Fonte: Estadão

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