O deputado federal reeleito por Minas Gerais Reginaldo Lopes (PT), líder da sigla na Câmara dos Deputados e integrante da equipe de transição do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), acredita que a eventual nomeação de políticos do estado como ministros tem uma relevância histórica. “Acho que a presença dos mineiros nos ministérios é importante, do ponto de vista emblemático, simbólico, da representação e da presença, no momento em que seus desafios estão colocados”, declarou. O parlamentar destacou ainda, em entrevista exclusiva ao Estado de Minas, os principais desafios e prioridades deste primeiro momento.
Nascido em Bom Sucesso, no Centro-Oeste mineiro, Reginaldo tem 49 anos e é filho de trabalhadores rurais. Economista, pós-graduou-se em gestão de pequenas e microempresas pela Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ). No Congresso Nacional desde 2003, o parlamentar enfrentou diferentes cenários, ora como situação, ora como oposição. Neste momento, na equipe de transição, Reginaldo integra o Centro de Governo, ao lado do senador Jaques Wagner (PT-BA) e dos também deputados federais José Guimarães (PT-CE), Lindbergh Farias (PT-RJ) e Márcio Macêdo (PT-SE).
Indagado sobre a possibilidade de assumir uma das pastas no terceiro mandato de Lula, o mineiro disse que para ele é “chato” falar sobre isso, mas ressaltou que os nomes só devem ser revelados após a diplomação do futuro presidente da República, em 12 de dezembro. Reginaldo também acredita que pode ser mais útil na Câmara dos Deputados, onde vai exercer o seu sexto mandato consecutivo. “Eu me considero mais maduro, mais preparado, mais calejado, mas também muito mais sensível”, ponderou.
O trabalho da equipe de transição tem funcionado?
Acredito que sim. Nós estamos com as dificuldades que o governo atual tem colocado, do ponto de vista da transferência de dados e informações, mas do ponto de vista de uma análise, revisitando o programa de governo do presidente Lula, visitando a realidade do país e também a realidade desses ministérios, combinado com o TCU, eu acho que nós vamos ter um bom diagnóstico, que vai ser uma peça importante para o início do governo Lula e da sua equipe ministerial.
Como está sendo conciliar os 31 grupos técnicos, com centenas de integrantes?
Há primeiro que se dizer que só 18 pessoas foram nomeadas. Do restante, todos são colaboradores voluntários. Às vezes as pessoas saem fazendo fake news, mas é bom dizer que todos os grupos de trabalho foram constituídos por pessoas colaboradoras, convidadas, voluntárias.
Quais os próximos passos do trabalho desenvolvido pela equipe de transição?
O presidente Lula vai receber todos os relatórios, dos 31 grupos temáticos e mais do grupo do Centro de Governo, de que eu participo. Depois disso, ele com certeza vai falar um pouco da herança que está recebendo do governo Bolsonaro.
Como está o processo para a aprovação da PEC da Transição? Qual prazo e o valor?
Acho que hoje o valor não é uma discussão mais importante. Eu acho que o grande debate hoje é o prazo. Discute-se se vão ser dois ou quatro anos. Acho que vão ser só dois anos, com uma revisão da Lei do Teto de Gastos. O que é principal na PEC é excepcionalizar o Bolsa-Família na casa de R$ 175 bilhões.
Como o senhor vê o retorno da nomenclatura do Bolsa-Família? Existe uma diferença?
Existe, porque o Bolsa-Família tem um conjunto de ações complementares e um conjunto de contrapartidas: vacinação, taxa vacinal, ações complementares de escola em tempo integral. Então, tem um conjunto. O Bolsa-Família é mais bem-estruturado. É um programa que foi reconhecido por mais de 100 países no mundo todo e é um programa federativo, que tem lá no município a porta de entrada no Cras, nos Creas. Então, é um modelo que tem mais resultados do ponto de vista da eliminação da extrema pobreza, da pobreza e do combate à fome.
O senhor acredita que é importante conciliar a divisão dos ministérios com outros partidos além do PT?
Sim, nós estamos promovendo uma frente ampla, uma frente de reconstrução. Então, todos aqueles que ajudaram a ganhar são legítimos e têm direito de ajudar a governar. E aqueles também que vão ampliar nossa base de governabilidade, mas também é evidente que o nosso partido está à disposição, assim como sempre esteve, para ajudar na governabilidade, no Parlamento, na Câmara e no Senado. Temos muitos quadros que estão preparados e à disposição do governo Lula para ajudar a governar.
O senhor acredita que podemos ter representantes de Minas Gerais em um ou mais ministérios? Como o senhor vê isso aí?
Nós que lutamos por Minas e pelo Brasil temos duas grandes tarefas. A primeira é promover, junto com o presidente Lula, entregas de algumas ações que possam melhorar a infraestrutura do nosso estado, juntamente às políticas sociais, mas política mais focada em Minas, eu diria que o nosso grande desafio é resolver o problema da infraestrutura porque Minas é o estado da logística nacional, o estado da integração nacional, é um pequeno Brasil. Então, acho que esse é o maior desafio de fazer a presença de Minas em Brasília. O segundo desafio, é lógico que é importante do ponto de vista emblemático, simbólico também da representação e da presença de mineiros no governo, então acho que esses dois desafios estão colocados.
Sobre a questão do Regime de Recuperação Fiscal em Minas. Como o senhor vê isso? O que acha que vai acontecer ao longo do próximo ano?
Acho que agora tem uma nova concepção sobre o papel do estado e se tiver um conselho que eu pudesse dar ao governador Romeu Zema (Novo), é que precisa esperar e ver em que base nós vamos reconstruir essas relações federativas, esse pacto federativo. Eu acho que não faz sentido mais o Zema tentar, na caneta ou na Justiça, aprovar um regime fiscal que, onde foi feito, pela regra dos governos anteriores, que impuseram um sacrifício aos estados, isso não recuperou o status. Pelo contrário, agravou os problemas sociais, inclusive os problemas fiscais.
O senhor volta a ser deputado federal de situação, como aconteceu de 2003 a 2016. Qual é a diferença daquela época para agora, com o governo Bolsonaro?
É evidente que eu me considero mais maduro, mais preparado, mais calejado, mas também muito mais sensível. Eu acho que a gente viveu a experiência do governo Lula, que foi transformador. Viveu a experiência de enfrentamento a um governo meio irresponsável, um governo bélico, de conflitos, que foi o do Bolsonaro, e agora a gente volta a governar o país. Esse acúmulo, essa experiência, traz mais amadurecimento e também muito mais responsabilidade. É como o presidente Lula tem dito: ‘Se fizer igual ou empatar, perde o jogo’. Então, nós temos a responsabilidade histórica de fazer mais mudanças estruturais, avançar mais e melhorar a vida do povo. Acho que esse é o grande desafio.
O senhor acredita que há caminho para o diálogo em uma Câmara que vai ter, por exemplo, 99 deputados do PL?
Vejo que nós precisamos dar uma pacificada no país, uma unificada. É evidente que temos o diálogo civilizatório como princípio, assim como os valores do direito humano. Nesse campo, você tem o eleitor do Bolsonaro, que também defende esses princípios. Então, nós precisamos ir ao encontro daqueles deputados que querem mudar o Brasil de fato, para ampliar a nossa aprovação e a popularidade do governo do presidente Lula. Isso vai ser feito com gestos, com diálogo e com programas que ampliam para além do nosso público.
Quais os principais gargalos para o senhor neste primeiro ano e que devem ser prioridades do governo?
Acho que é combater a fome. Dado do IBGE, da semana passada, mostra que 46% das crianças, 20 milhões de meninos e meninas, estão passando fome, estão na extrema pobreza. Não há nada mais cruel no mundo do que uma criança pedindo um alimento. Então, acho que esse é o grande desafio, a prioridade absoluta. Em paralelo, a retomada de emprego e da renda. É um conjunto de ações complementares, mas, se for para escolher, é evidente que a prioridade absoluta é não deixar nenhum brasileiro passando fome.
Como o senhor vê os protestos que questionam a vitória de Lula nas urnas?
Acho que todo tipo de manifestação baseada nas regras do Estado democrático de direito é importante para qualquer democracia. Agora, manifestações contra o regime democrático e contra as instituições da República brasileira são atos que merecem todo o nosso repúdio e que, na verdade, conspiram contra a liberdade, contra a família, contra o princípio cristão e contra a própria democracia. Então, acho que essa questão pedindo a volta da ditadura, a intervenção militar, eles deveriam repensar.
Como o senhor avalia a postura do presidente Bolsonaro, que após a derrota reduziu drasticamente a agenda?
Bolsonaro nunca gostou e nunca foi muito adepto ao trabalho. Se você pegar a agenda dele como presidente da República durante os quatro anos, ele também não trabalhou, não dedicou mais do que três horas por dia. Quem quer mudar o Brasil, quem quer reconstruir um país, quem quer combater a desigualdade... Eu acho que tem que trabalhar pelo menos umas dezesseis, dezessete horas por dia.
O que será feito por Minas?
O que posso me comprometer com Minas é que eu estarei ao lado do presidente Lula para a gente buscar resolver os grandes gargalos do estado. Então, nós vamos estar trabalhando muito nesse sentido. O metrô, o Rodoanel, as obras de infraestrutura regionais, as BRs 381, 040, 116, 262, 367, 251 e 135. A gente sabe desses grandes gargalos e quero atuar durante quatro anos para buscar algumas soluções.
Além das demandas que o senhor já citou, o que considera importante focar em Minas Gerais agora nos próximos quatro anos?
Acho que a infraestrutura viabilizaria Minas a atrair mais investimentos. Acho que Minas é o pior estado de infraestrutura do país e, por ser um estado de integração nacional, um estado de logística, um pequeno Brasil, essa é uma prioridade que nós precisamos resolver. Mas tem outras, eu acho que nós precisamos repensar um modelo econômico para Minas que possa ser mais descentralizado, um modelo que tenha condição e capacidade de potencializar as diversas vocações econômicas. Por Minas ser um pequeno Brasil, você tem muitas.
É um estado demograficamente muito parecido com o Brasil. E aí requer um projeto mesmo, de desenvolvimento regionalizado, de uma economia nova, descentralizada e de um modelo que pudesse agregar valor. Minas tem as principais commodities que são exportadas. Você tem terras raras, lítio e nióbio tem valor agregado. Você tem a exportação de frutas, de soja, de milho, de alimentos, de grãos, que poderiam também ter valor mais agregado. Você tem muita exportação de minério, que poderia recuperar um pouco da capacidade da siderúrgica mineira.
Você tem a potencialidade do sol, da água e do vento na questão energética. Você tem a potencialidade do etanol, que a gente poderia, além do etanol, quem sabe desenvolver o biodiesel da cana. Você tem estudos sobre gases. Então eu acho que nós temos aí um universo de oportunidades, tanto do ponto de vista econômico quanto do ponto de vista cultural, nós temos um estado muito rico. Então, acho que cabe um modelo descentralizado, por macrorregiões, que tenha papel como um indutor às ações dos municípios, combinada com o estado e articulada com a União.
Estadão