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RJ trocou em 2018 nome de registro de morte causada por policiais, mas mantém método criticado por especialistas

Por Jr Blitz 26/09/2021 às 04:05:54
Especialistas discordam do método de registro e afirmam que medida gera subnotificação das mortes causadas pela polícia. Ágatha Félix, Maria Eduarda e Eduardo — crianças mortas durante operações em favelas — tiveram casos registrados como homicídio. VÍDEO: Especialistas comentam subnotificação das mortes causadas pela polícia

Apesar de ter adotado nova nomenclatura para registrar casos de morte causadas por agentes de segurança em 2018, a Polícia Civil manteve – na prática – o método de registro antigo, que teve origem na ditadura militar. A forma como é feita a contagem é criticada por especialistas ouvidos pelo g1, que acreditam em uma subnotificação dos casos.

Nos tempos da ditadura militar, a categoria era tipificada como “autos de resistência”. Eram registrados, dessa forma, casos de homicídios não naturais produzidos por agentes quando houvesse resistência.

Uma determinação do Governo Federal considerou a tipificação anacrônica e pediu a mudança do termo de registro. O homicídio causado pela polícia deveria ser registrado como "morte causada por intervenção do agente de estado", independente se houve resistência ou não. Apesar disso, a Polícia Civil manteve a metodologia do passado.

De acordo com especialistas, o sistema adotado causa uma subnotificação da letalidade policial no estado. Ou seja, o número de mortes causadas pela polícia pode ser maior do que o apresentado.

“Estamos trabalhando no escuro em relação aos dados de letalidade policial. Isso é muito ruim porque toda política pública baseado em dados é muito melhor”, afirmou o coordenador do Grupo de Estudo dos Novos Ilegalismos (Geni) da UFF, sociólogo Daniel Hirata.

Procurada pelo G1, a Polícia Civil informou que, a pedido da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), alterou os registros chamados de “autos de resistência” para “morte por intervenção causada por agente do estado” em 2018.

Eles informaram ainda que, na prática, os casos registrados como mortes por intervenção de agentes do estado “são situações em que o policial apresenta a ocorrência afirmando que tal morte aconteceu por causa de uma reação em legítima defesa”.

No decorrer da investigação, caso não seja provado que a ação foi em legítima defesa, o agente responde pelo crime de homicídio.

Ex-chefe do Estado Maior da PM critica

O ex-comandante do Estado Maior da Polícia Militar, coronel Robson Rodrigues, afirmou que a dinâmica implantada na secretaria não é eficiente.

“Intervenção policial não quer dizer que já tenha resistência. Não é isso, não foi isso que essas normativas quiseram colocar. Eu acho que há um equívoco. Houve a transformação na terminologia, mas os critérios para se registrar dentro dessa categoria seguem os mesmos”, disse Rodrigues.

“Esse fato prejudica a todos. Não só a nós como sociedade, os pesquisadores para que possam fazer uma análise mais crítica, como as próprias instituições de segurança pública. Porque elas têm necessidade de controlar suas ações, estudar melhor suas ações e diagnosticar as ações para poderem implementar ações de correção das atitudes que estão sendo tomadas”, completou o coronel.

As normativas citadas por Robson Rodrigues pediam o desuso da terminologia “autos de resistência", que se tratava de uma “herança” da ditadura militar e significava mortes causadas em situações de legítima defesa.

Segundo ele, as mortes por intervenção dos agentes do estado não deveriam, na teoria, contabilizar apenas os casos de trocas de tiros, mas todas as mortes causadas por forças policiais.

Crianças mortas pela polícia

Um levantamento feito pelo g1 mostra que crianças inocentes mortas de forma violenta pela polícia em comunidades do Rio de Janeiro não tiveram seus casos registrados na estatística de “mortes causadas por intervenção de agente do estado”.

Segundo os dados obtidos, pelo menos três casos não foram tipificados como “morte por intervenção dos agentes de estado". Os policiais autores das mortes responderam pelo crime de homicídio.

São eles:

Ágatha Félix, de 8 anos, morta por um tiro de fuzil no Complexo do Alemão

Ágatha Félix, morta por bala perdida no Alemão

Reprodução

Maria Eduarda, de 13 anos, morta ao ser baleada dentro de sua escola

Maria Eduarda foi morta no pátio da escola em que estudava, no Rio

Reprodução/TV Globo

Eduardo, de 10 anos, morto na porta de casa por um tiro de fuzil durante operação no Alemão

Eduardo foi vítima de um tiro de fuzil aos 10 anos em 2015

Divulgação/Arquivo Pessoal

Apesar de todas as três crianças citadas na reportagem terem sido mortas por um tiro que partiu da polícia, nenhum dos casos entrou para a estatística de "mortes causadas por agentes do estado".

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'Método da polícia tem objetivo de evitar prisão de policiais', diz especialista

Na opinião de Daniel Hirata, o método é grave e tem como objetivo evitar prisões em flagrante de policiais que tenham cometido um crime de homicídio. Para ele, o número de mortes causadas por policiais — em serviço ou não — deveria ser disponibilizado.

“É muito grave. Esses são casos, evidentemente, decorrentes das ações policiais e eles não são contabilizados porque essa categoria "mortes por intervenção de agentes do estado" é uma categoria administrativa, criada para evitar que policiais que cometeram homicídios sejam presos em flagrante, tendo como pressuposto que o policial agia em legítima defesa”, disse Hirata.

“Seria importante que o Instituto de Segurança Pública (ISP) disponibilizasse para qualquer cidadão, como faz com todos os outros dados, os homicídios cometidos por policiais em serviço e fora de serviço. Com essas duas categorias, nós teríamos uma maior aproximação dos homicídios causados por policiais”, completou o pesquisador.

Fonte: G1

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