Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares não recebeu recursos suficientes para manter produção de insumos utilizados no diagnóstico e no tratamento de câncer. Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação diz que liberação de verba depende do Congresso. Instituto do Cérebro (InsCer), de Porto Alegre, calcula prejuízos no tratamento de 65 a 70 pacientes
Camila Cunha/PUCRS
A suspensão da produção de remédios utilizados no diagnóstico e no tratamento de câncer alerta hospitais do Rio Grande do Sul, que já relatam reflexos no atendimento de pacientes. Na segunda-feira (20), o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN) paralisou a fabricação de radiofármacos e radioisótopos por tempo indeterminado em razão da falta de verba.
O órgão é vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), que, na quarta (22), liberou R$ 19 bilhões para que o IPEN mantenha a operação. Contudo, a verba corresponde a 21% dos R$ 89,7 milhões necessários para que o instituto continue sua produção até o fim do ano. A pasta afirma que o ingresso de recursos depende de aprovação no Congresso. Veja nota abaixo
No Instituto do Cérebro (InsCer), mantido pela PUCRS, de 65 a 70 pacientes com câncer já são afetados pela falta de tecnécio, elemento químico utilizado para exames diagnósticos. O médico Diego Pianta, que atua na unidade, afirma que a medicina nuclear depende do insumo.
"Se a gente não tem o tecnécio, a gente para a medicina nuclear no Brasil. Tudo depende de tecnécio", alerta.
Pianta ainda explica que não é possível armazenar o isótopo em razão de sua meia-vida, que é o tempo necessário para que metade dos átomos de um isótopo radioativo se desintegre.
"A gente tem certeza que, a partir do dia 27, não tem mais material radioativo chegando. Do tecnécio, a meia-vida é de seis horas, ou seja, a cada seis horas, metade dele desaparece", comenta.
A falta do insumo não afeta apenas pacientes com câncer, explica o médico do InsCer. O exame de cintilografia, uma técnica de diagnóstico por imagem, também é feito em pacientes com problemas cardíacos, renais e pulmonares, inclusive embolias provocadas pela Covid-19. Além disso, o instituto relata preocupação com os estoque de iodo, lutécio e MIBG.
Preocupação em hospitais da Capital
O Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), por exemplo, ainda tem insumos suficientes para manter o gerador de tecnécio. Sem a garantia de entrega por parte do IPEN na próxima semana, a instituição já procura um outro fornecedor para manter o serviço.
Por outro lado, o hospital já não tem iodo, usado para tratamento de algumas doenças da tireoide, em estoque. Nenhum paciente deixou de ser atendido, mas, segundo a chefe do Serviço de Farmácia do HCPA, Thalita Silva Jacoby, a instituição depende de novas remessas do IPEN.
"No HCPA, o cenário é preocupante, pois não recebemos até o momento nenhum documento oficial do IPEN referente ao fornecimento de gerador de tecnécio e iodo para a próxima semana", diz.
Caso o IPEN não atenda a demanda de insumos para o gerador de tecnécio, o hospital terá que restringir a realização de exames de cintilografia somente para pacientes internados. Nesse caso, os exames ambulatoriais serão cancelados.
Fachada do Hospital de Clínicas, em Porto Alegre
Gustavo Diehl/Secom/UFRGS
Também em Porto Alegre, o Grupo Hospitalar Conceição (GHC) relata dificuldades em relação a insumos do tipo desde o início do ano. No entanto, os hospitais da instituição têm alternativas diagnósticas em relação aos radiofármacos e radioisótopos. Atualmente, estão em falta dois fármacos utilizados para exames cintilocerebrais e algumas avaliações cardíacas.
"Em um cenário de retomada da produção, não teremos riscos maiores de desabastecimento", afirma o GHC.
Já o Hospital Santa Rita, da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, estima ter o suficiente para diagnósticos e tratamentos até o fim de setembro, diz a entidade.
A Federação dos Hospitais e Estabelecimentos de Saúde do RS (FEHOSUL) afirma que está acompanhando a situação, que ainda não se materializou crítica no estado. "Até o momento não foram reportadas demandas por parte de hospitais e clínicas de medicina nuclear", diz a entidade.
Nota do MCTI:
"Foi publicada nesta quarta-feira (22) em edição extra do Diário Oficial da União a PORTARIA SETO/ME Nº 11.491, liberando R$ 19 milhões para a atividade de produção e fornecimento de radiofármacos no País, executada pelo Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN), vinculado à Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN/MCTI). A portaria permitirá a compra imediata de insumos importados para regularizar a produção dos radiofármacos e é resultado do trabalho do Governo Federal, por meio do MCTI – Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações com o Ministério da Economia.
Com caráter emergencial, o texto é uma alternativa mais rápida para complementar os recursos do IPEN. O Governo Federal vem atuando desde junho de 2021 em conjunto com Congresso Nacional para a recomposição total do orçamento do Instituto. O PLN 16/2021, previsto para ser votado na próxima semana, disponibilizará recursos ao IPEN no valor de R$ 34 milhões. A aprovação de um novo projeto de lei, da ordem de R$ 55 milhões, será necessária posteriormente para recompor o orçamento do Instituto até o fim do ano.
A gestão atual do MCTI tomou providências para resolver a questão da produção de radiofármacos de forma definitiva. Estudos para reduzir a fragilidade do processo da compra de insumos e fabricação dos produtos, bem como o projeto do Reator Multipropósito Brasileiro, que receberá recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), têm o objetivo de permitir que o Brasil produza seus próprios insumos e reduza a dependência de produtos importados. Além disso, o MCTI encaminhou pedido de orçamento completo para o IPEN em 2022.
Por fim, para solucionar definitivamente a situação orçamentária do IPEN em 2021, o MCTI espera que o PLN 16/2021 seja aprovado o mais rápido possível, e que seja aprovado em tempo hábil o futuro projeto de lei que irá recompor totalmente o orçamento do Instituto, totalizando R$ 90 milhões. Já para 2022, o MCTI recomenda que a Lei Orçamentária enviada ao Congresso seja ratificada com o aumento solicitado para a pasta e sem cortes, para evitar que a escassez de recursos não venha a se repetir."
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Fonte: G1